Quando se gosta da nossa freguesia, gosta-se de cada um dos seus aspectos, os cantos, os recantos e os encantos. Gosta-se da sua paisagem, dos caminhos, do casario, dos lugares, dos outeiros e dos vales por onde correm regatos. Os campos, como pedaços de pano cosidos em cômoros por onde crescem videiras entrelaçadas em choupos e que formam uma manta verde e viçosa de milheirais e de ervas. E esse gosto é diferente mas complementar em qualquer dia, mês ou estação do ano.
Mas gosta-se sobretudo das pessoas, de todas, tanto as com quem menos privamos como aquelas que melhor conhecemos e com quem partilhamos memórias e histórias. Gosto particularmente de falar com as pessoas, mais novas ou mais velhas, com mais ou menos experiência de vida, mas sobretudo gosto de as ouvir. Das muitas ocasiões propícias, foi um dos aspectos enriquecedores as três vezes em que tive a oportunidade de percorrer a freguesia no Compasso da Páscoa, uma delas como Juiz da Cruz.
Como nos diz a brasileira Carla Faour no seu livro "A Arte de Escutar", "escutar é mais que ouvir. É mais do que estar em frente a alguém. Escuta-se por todas as células do corpo. Escuta-se com as mãos, com os olhos, com a respiração, escuta-se, inclusive, com os ouvidos. Uma postura escuta, um gesto escuta, a boca escuta. Há que se deixar apagar e se concentrar no outro. Há também que se eliminar quaisquer ruídos de interferência – como pensamentos que voam, telefones que tocam, vaidades que afloram, vontade de ir ao banheiro. Muitos dizem que a fala distingue o ser humano dos outros animais. Discordo. Saber escutar é o que nos dá humanidade".
Conversando e escutando, pois, com muitos dos Guisandenses, aprende-se sempre. Fica-se a conhecer os seus pensamentos, as suas ideias, as suas preocupações e anseios. Os seus consolos e desconsolos. Há sempre um desabafo, uma opinião, uma sentença, um provérbio, uma história particular, um lamento ou orgulho para com um familiar ou amigo. Há sempre um parecer formado sobre o seu lugar, a sua rua, a freguesia, o estado do país e do mundo. Há sempre lugar para um olhar sobre o clube de coração ou sobre o clube da terra.
Há sempre quem queira conversar mas sem diálogo, sem saber ouvir ou escutar mesmo que pareçam a mesma coisa. Há sempre quem queira conversar para pedir, para pressionar, para seduzir. E no entanto, basta na maior parte dos casos saber ouvir para se encontrar respostas ao que queríamos dizer, pedir ou transmitir.
Esta capacidade e gosto de conversar e sobretudo escutar, aos poucos vai cedendo importância na nossa sociedade porque vai perdendo a batalha com outras formas de conversar mais virtuais, mais egocêntricas. Nas redes sociais temos catrefadas de "amigos" e contudo quado nos cruzamos pessoalmente não somos capazes de balbuciar um simples olá.
Não pensem que este gosto de conversar e sobretudo escutar é de agora. Recordo com saudade as várias entrevistas que ao serviço do saudoso jornal "O Mês de Guisande" fiz a várias pessoas idosas da freguesia, a maioria das quais já partiu. Quantas longas horas conversei e escutei o saudoso P.e Francisco. Quanto com todas essas pessoas aprendi, coisas de si próprias mas sobretduo da vida e da nossa comunidade.
- Américo Almeida