21 de janeiro de 2020

Os sebastiões dos nossos dias


Depois da devoção ao mártir S. Sebastião, que hoje em dia em grande parte vai-se confundindo com uma coisa doce chamada fogaça, porque como humanos tendemos a valorizar mais o estômago que o espírito, a semana de trabalho começa nesta Terça-Feira, bem fria,  por isso mais curta. 

Assim, retomam-se as rotinas, cada um na medida da sua vida, desde crianças aos mais velhos. Uns, poucos e cada vez menos, para a creche, outros, também cada vez menos, para a escola, outros para o trabalho e outros, também poucos, para lares, porque os nossos idosos, podendo mexer-se, mesmo queixando-se dos ossos,  preferem a horta, o quintal, o jardim, para se irem ocupando. É compreensível pois são as suas zonas de conforto, como agora é moda dizer-se. Muitas vezes numa zona de conforto desconfortável porque na solidão, é certo, que se disfarça quando o tempo vai de feição e o sol é companhia permitindo deambular por entre flores e legumes, mas que se melancoliza quando a chuva os retém entre quatro paredes. 

Mas são opções e se a alguns não resta outra solução, a outros há a alternativa de frequentarem o Centro Cívico e ali encontrarem companhia entre outros semelhantes e com isso, na partilha da amizade e dos males e memórias muitas vezes comuns, certamente o dia passará melhor. Mas, como disse, são opções a quem nem todos recorrem, sendo que o essencial é que cada um esteja onde melhor se sinta, mesmo que isolado em casa, bem como é importante que exista alternativa.

Certamente que as agora gerações mais novas terão no futuro outro entendimento quanto a usufruírem desse espaço de convívio e partilha, o que será natural ,pois em grande parte tudo passa por forças culturais e identitárias que nos moldam. Cada um no seu tempo. Os nossos pais têm uma matriz, nós temos outra.

Neste sentido, e para que exista essa alternativa na nossa freguesia, não há como negar o apreço a todos aqueles que no processo de levantamento do nosso Centro Social têm desde há longos anos, lutado com esforço e dedicação para que as nossas gentes, querendo, possam usufruir de um espaço comunitário, de partilha e convívio inter-geracional, que ajude a alegrar os dias numa fulcral etapa do natural declínio da vida. Calha a todos. 

Nem sempre apoiados, nem sempre compreendidos, nalguns aspectos e por alguém até criticados e censurados, é de justiça salientar nomes como os de Joaquim Santos e Celestino Sacramento, mas muitos outros, claro, que têm, contra muitas dificuldades, tanto na freguesia como de entidades institucionais, aguentado o barco, na esperança que dias melhores  virão, não tanto para eles, mas para a comunidade e sobretudo para as gerações mais velhas.

Como em muitas situações na vida e na História, tais actos e obras só lhes serão valorizados postumamente. Mas se até Jesus foi maltratado na sua Nazaré, não surpreende que mesmo nos dias de hoje, salvo as devidas diferenças e distâncias, ainda hajam alguns "mártires", alguns "sebastiões", não com a dimensão do S. Sebastião, pois não, mas na nossa medida de gente pequena, em que as setas que se nos cravam no peito não sendo mortais, são dolorosas pela indiferença e mesmo pela desconsideração.

Bem hajam!