Por força do meu trabalho, um pouco por todo o concelho tenho visitado inúmeras instalações de pavilhões industriais, modernamente ditos de actividades económicas, na maior parte das vezes, com uma raíz clandestina ou com ampliações e alterações substanciais relativamente ao título de edificação original, sem alvarás de utilização e com actividades quase sempre sem as necessárias autorizações. E algumas dessas empresas literalmente com largas dezenas de trabalhadores.
A enfeitar o ramalhete, muitas dessas instalações, onde trabalham pessoas, não têm condições de higiene e segurança nem cumprem alguns dos requisitos regulamentares, nomeadamente quanto a pés-direitos, instalações sanitárias, acessibilidades, etc. Já para não falar nas questões de gestão e tratamento de resíduos e efluentes. Quanto à integração urbana e qualidade arquitectónica, é melhor passar.
Mas apesar de tudo, porque a economia não pode parar, as coisas vão rolando nesta ilegalidade e parece que ninguém fiscaliza nem penaliza. De resto o problema não é de agora e a incidência é naturalmente maior em construções concretizadas nas décadas de 1970, 80 e 90 e englobam muitas das chamadas empresas de vão de escada. As zonas industriais vieram estabelecer alguma ordem e construções e actividades relativamente licenciadas, mas para trás é um Deus nos acuda.
Ainda por estes dias, estive numa empresa com a instalação implantada literalmente à face de uma linha de água com alguma importãncia na nossa rede hidrográfica, com instalações ainda sem acabamentos interiores, com tijolo e blocos à vista, com um sanitário para homens e mulheres, com as diferentes peças sanitárias num único espaço, etc. Pensei que isto não era possível nestes tempos, em que para se fazer um galinheiro ou levantar um muro aos 2,20 metros é obrigatório um projecto e uma licença. Mas sim, são mais que muitas estas situações precárias. No nosso concelho, claro.
Mas paradoxalmente, e nestas coisas há sempre paradoxos, fico chocado quando, como ainda há algum tempo em Canedo, o proprietário de uma humilde habitação, só porque estava a habitar sem o respectivo alvará de utilização, foi penalizado com a aplicação de uma coima que naturalmente teve que pagar, mesmo que com o especial favor de ser em prestações. O choque e esta disparidade de critérios, é maior quando se sabe que a família tem poucos recursos, a esposa tem um simples emprego de ordenado mínimo e o marido sem emprego porque com problemas de doença e de mobilidade.
Como cereja no topo do bolo, importa dizer que habitações habitadas no nosso concelho sem os respectivos alvarás de utilização são mais que muitas. Mesmo muitas. Já quanto a construções com alterações e ampliações não licenciadas, serão seguramente aos milhares.
Deixemos, pois, a economia rolar porque importa o índice de empregabilidade, dê-se tempo e lugar a que as empresas regularizem as suas situações, mas, por favor, não penalizem quem menos pode, quantas vezes por uma mera lana caprina, porque só acentua o sentido de injustiça para os mais fracos e impunidade de quem mais pode e prevarica com coisas de significado. No fundo, evitar a máxima "ser fortes com os fracos e fracos com os fortes".