13 de dezembro de 2021

IMI - Áreas brutas privativas e dependentes


Para quem lida com assuntos de inscrição de prédios e edifícios nos serviços de Finanças, nomeadamente no que concerne ao IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis, não raras vezes depara-se com dificuldades na diferenciação do que são consideradas áreas brutas privativas e áreas brutas dependentes. E esta diferenciação é importante já que influencia a avaliação do valor patrimonial/tributável, porque ambos os tipos de áreas têm aplicados diferentes coeficientes e em consequência o valor do imposto.

Os números 2 e 3 do artigo 40º do CIMI - Código do Imposto Municipal de Imóveis faz a seguinte caracterização de ambas, concretamente: 

Ponto 2 - A área bruta privativa (Aa) é a superfície total medida pelo perímetro exterior e eixos das paredes ou outros elementos separadores do edifício ou da fracção, incluindo varandas privativas fechadas, caves e sótãos privativos com utilização idêntica à do edifício ou da fracção, a que se aplica o coeficiente 1.

(Redacção dada pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12)

Ponto 3 - As áreas brutas dependentes (Ab) são as áreas cobertas e fechadas de uso exclusivo, ainda que constituam partes comuns, mesmo que situadas no exterior do edifício ou da fracção, cujas utilizações são acessórias relativamente ao uso a que se destina o edifício ou fracção, considerando-se, para esse efeito, locais acessórios as garagens, os parqueamentos, as arrecadações, as instalações para animais, os sótãos ou caves acessíveis e as varandas, desde que não integrados na área bruta privativa, e outros locais privativos de função distinta das anteriores, a que se aplica o coeficiente 0,30.

(Redacção dada pela Lei nº 53-A/2006, de 29/12)

Estas caracterizações aparentemente parecem claras, no entanto são, em meu humilde entendimento, confusas, e desde logo porque parecem ser direccionadas para os edifícios ou fracções em regime de propriedade horizontal, onde realmente há áreas exclusivas e eventualmente áreas comuns. Daí o conceito de "privativa" para diferenciar o que é ou não de uso exclusivo. Por conseguinte, no que se refere a prédios e edifícios de propriedade total ou única, isto é, sem fracções constituintes, o conceito de diferenciação por área privativa e área dependente já não faz sentido porque em rigor tudo é privado.

Ora o que acontece nas inscrições ou actualizações de IMI, sobretudo nos tais prédios de propriedade total ou única, o contribuinte ou quem o representa, como um advogado, solicitador, ou qualquer outro técnico, procura reduzir o impacto da avaliação e do consequente valor tributável, sobre o qual incide o imposto e para isso, por regra, inscreve como área privativa apenas aquela relacionada à habitação, como cozinha, quartos, salas e instalações sanitárias, corredores e vestíbulos e o resto, como anexos, garagens ou arrecadações é inscrito como área dependente. 

O código fala de áreas acessórias relativamente ao uso a que se destina o edifício ou fracção, mas em sede de licenciamento da construção, e por exemplo no que se refere a uma moradia, a Câmara licencia o uso para habitação e nesse uso principal estão incluidos todos os elementos, compartimentos e anexos, mesmo que com funções naturalmente diferentes. Ou seja, um anexo pode ter uma função de curral, de garagem ou lavandaria mas integra o conjunto afecto a uma utilização da habitação.

Em resumo, este código como muitos outros, são propícios a diferentes interpretações e os próprios serviços de finanças e respectivos peritos ou funcionários, têm igualmente diferentes interpretações e em face delas diferentes cálculos. Ou seja, para o mesmíssimo prédio, se tal fosse possível, na repartição x pagaria um imposto z mas na repartição y eventualmente pagaria um imposto k.

Em meu entendimento, essa confusão poderia ser sanada ou pelo menos ficar mais clara, desde logo se a tal diferenciação de áreas privativas e dependentes fosse aplicada apenas aos prédios em regime de propriedade horizontal e que todos os restantes prédios em propriedade total fossem apenas caracterizados por áreas privativas com a diferenciação a ocorrer na função e não na utilização do conjunto, de modo a que naturalmente um curral ou uma garagem não tenha o mesmo peso de uma sala, cozinha ou quarto.

Pode parecer que a coisa vai dar ao mesmo, mas não. Outro exemplo, e conheço casos práticos: Se um determinado pavilhão foi licenciado todo ele como de utilização de indústria do tipo3, porque carga de água em sede de IMI tem que se considerar como áreas dependentes parte ou partes desse pavilhão, só porque se entende como área de armazém ou outra pseudo-acessória. Mas então a utilização principal e inerente ao licenciamento não é de indústria? No fundo uma actividade é composta por diferentes áreas e funções, como zonas de laboração, de armazenamento de matéria prima, armazenamento de produto acabado, zonas de expedição, zona administrativa, garagens, oficinas de manutenção, etc, etc, mas sempre tudo afecto à tal utilização principal. 

Por conseguinte, em sede de IMI fazer uma diferenciação de áreas privativas e áreas dependentes resulta no tal exercício algo aleatório e mesmo oportunista,  o tal atirar o barro à parede para ver se cola, e em vez de se ficar a pagar x de imposto ficar a pagar apenas y. E quando cola, a diferença de imposto anual pode ser de milhares, dependendo obviamente da utilização, da área bruta total, bem como de outros factores como área de terreno, localização, idade, etc.

Mas tudo isto e toda esta opinião em rigor vale zero, porque na realidade vai-se continuando com esta duplicidade de critérios e interpretações do que vai fazendo lei e regulamento. 

Recomenda-se, por isso, o que se vai fazendo à fartazana, que áreas que na realidade estão afectas às utilizações principais, seja habitação, serviços, comércio, armazém ou indústria, sejam inscritas nas Finanças como áreas dependentes, nem que se tenha que transformar uma sala numa lavandaria e um quarto numa zona técnica. E já agora, entre o usar a descrição de garagem e/ou aparcamento, para aquela local onde temos temos o automóvel, faz diferença na conta. Confuso, não é? 

É literalmente atirar o barro à parede. Umas vezes cola, outras não. Ah, claro, e como habitalmente, ter bons amigos ou conhecimentos adequados nos serviços, em que de algum modo estes tenham uma interpretação mais favorável e abrangente ao que poder ser abarcado como áreas dependentes, pode eventualmente fazer a diferença entre o pagar balúrdios de imposto ou um valor mais jeitoso. Não está em causa, de modo algum, de manipulação ou actos que configurem corrupção ou favorecimento, mas tão somente uma interpretação eventualmente mais favorával da tal caracterização do código do IMI. Considerar ou não que uma determinada área possa ser elegível como dependente ou privativa faz a toda a diferença.

Já quanto à inscrição de terrenos urbanos destinados a construção, obviamente que importa estimar uma construção com a menor área possível. Uma humilde e alegre casinha tipo T1 é mais que suficiente. É que se não for feito desse modo, as Finanças consideram que todos nós somos ronaldos capazes de edificar uma mansão de 10 assoalhadas.

Seja como for, o IMI é sempre um imposto injusto e estúpido porque em rigor é uma renda que pagamos da nossa própria habitação. Ademais, em sede de licenciamento e construção foram várias as taxas já pagas, incluindo as tais urbanísticas. Um autêntico e permanente meter a mão ao bolso dos contribuintes.

Para além de tudo isto, fugir ao IMI, habitando durante dezenas de anos sem declarar a construção, é um crime que compensa. O pagamento dos quatro anteriores anos pode ser ridículo quando se habita há já 10 ou 20 anos sem pagar ou a apagar apenas o tal valor do terreno destinado a construção. E o que não faltam por aí é desses exemplos.


[foto: arabiscos.com]