Tenho lido e ouvido muita coisa sobre o assunto que vai fazendo parte da actualidade, o relatório da Comissão Independente para o Estudo dos Abusos Sexuais na Igreja portuguesa que recebeu 512 testemunhos validados, tendo já sido enviados 25 casos para Ministério Público.
A Igreja tem que se penalizar ela própia por esta triste e condenável realidade, oculta e disfarçada durante longas décadas, sendo que o fenómeno não é de agora e é transversal a nível mundial e a diferentes sectores da sociedade, pelo que não de todo exclusivo de Portugal, da Igreja e da religião. Todavia, a Igreja, pela importância moral que deve ter como exemplo e prática da doutrina evangélica, obviamente que tem um grau maior de culpa e responsabilidade pelo mau exemplo e descrédito para a sua estrutura, tanto mais que muitos dos abusos terão ocorrido em contextos de debilidade social e psicológica.
Apesar disso, sem tirar nem pôr, parece-me que há em alguns sectores neste nosso país das bananas, figuras a espumarem-se pela boca para uma condenação prévia e sumária de tudo o que seja padre e figura da Igreja, condenando-se a parte pelo todo. Gente que não gosta da Igreja vê aqui uma oportunidade de ouro para a atacar de cima a abaixo. Por isso, às consideração do patriarca de Lisboa, D. Manuel Clemente, de que é necessário julgar de acordo com as regras da Justiça e com direito ao contraditório, choveu um coro de condenações e julgamentos. Como se costuma dizer agora, foi "arrasado"!
De cordo com o nosso código penal, um pedófilo pode abusar de dezenas de crianças ou um assassino liquidar dezenas ou centenas de pessoas, que terão sempre direito à presunção de inocência, à sua defesa, ao contraditório, e só depois de julgados e provados os factos é que serão condenados e não mais que a 25 anos de prisão, abusem ou matem uma, dez ou mil pessoas. Mesmo na prisão terão todos os direitos de dignidade e supervisionados pela Amnistia Internacional, mesmo o maior de todos, o que suprimiram às suas vítimas indefesas e inocentes, o direito á vida.
Por isso, não deixa de ser surpreendente este sentimento de justiça pura e dura para com uma lista de padres que por mais condenável que seja e motivo de aplicação da Justiça, não mataram nem aniquilaram, mesmo que certamente que para muitas vítimas tenham causado sofrimento moral e psicológio com repercursões para a vida.
Mas também sabemos que nestas coisas não basta apesar de tudo, apontar o dedo ou tecer enredos envolvendo pessoas e figuras e, no caso, padres. Por isso uma das pedras bases da Justiça é o direito ao contraditório e à defesa e à prova dos factos, por mais difícil que seja, desde logo pelo tempo que decorreu sobre os supostas factos.
Em todo o caso, que se julgue e condene se para tal houver provas, mas que se dê direito ao contraditório e à defesa e não neguemos a uns o que defendemos para outros, a presunção de inocência e direito ao bom nome. Bem sabemos que um padre não é um assassino ou um criminoso de colarinho branco, um banqueiro ou um ministro corruptos, mas, pessoas tidas mais em conta no julgamento de muitos. Mas, mesmo assim e sem esse beneplácito, porra, têm direito aos mesmos direitos nomeadamente no que à Justiça diz respeito.