E sabem lá os mais novos o que isso é! Escolher feijões? Quando muito pensarão que é, nas prateleiras das grandes superfícies de distribuição, escolher entre as diversas opções de latas ou sacos de branco, preto, vermelho, fradinho, de manteiga, catarino, etc, etc. E se possível já cozido, pronto a misturar com um arroz, massa ou sopa.
Realmente, para quem nunca passou por isso, apesar de, com a internet, não faltar informação disponível na ponta dos dedos, haja vontade e interesse, é certo e sabido que uma grande parte dos mais novos não têm noção do caminho, dos processos que passam os alimentos até chegarem às nossas despensas e depois à mesa. Não custa acreditar que ainda haja gente que não sabe a proveniência de um ovo, de uma salsicha, do fiambre ou do queijo. A ignorância ainda é muita e com o afastamento das pessoas das realidades do campo, tudo é possível. Daí que ainda se veja criançada surpreendida quando visitam uma qualquer quinta com animais domésticos, como galinhas, ovelhas e burros, a que agora pomposamente se designa de pedagógica. Vejam só!
Pois bem! Se é certo que os mais novos pouco perceberão da poda, os mais velhos sabem perfeitamente o que é isso de escolher feijões. Actualmente já nem tanto, apenas umas amostras de feijão de vagem, ou rasteiro, nas nossas hortas, mas ainda há algumas dezenas de anos eram habituais as sementeiras em larga escala, ou como monocultura ou misturado com o milho. Ora, algumas vezes por mistura acidental, outras vezes propositadamente, até porque as sementes recolhiam-se de ano para ano, quase sempre na colheita e depois da debulha, que ao contrário do milho, era em grande parte manual, mesmo que ligeiramente batida na eira, certo é que o habitual era haver feijões de várias espécies e cores pelo que havia então a necessidade de os escolher, ou apartar. Entre os lisos e de várias cores, branco, vermelho, amarelo, roxo, preto, os mais comuns, até aos riscados e ainda o fradinho, era uma tarefa minuciosa, de paciência e obviamnete aborrecida, sobretudo para a criançada quando os pais os obrigavam a essa empreitada.
Mas era uma tarefa que tinha que ser feita, principalmente quando havia a necessidade de vender, e havia compradores que percorriam as aldeias a comprar feijão, mas também porque se a cozinhar de forma misturada, devido a diferentes graus de dureza, o feijão requeria diferentes tempos na panela, mesmo que depois de demolhados.
Mas mesmo ainda antes da debulha, limpeza com crivo e a escolha, o feijão regra geral era chato de colher, porque semeado entre o milho. Requeria cuidado e sobretudo muita água.
Nos tempos modernos, já pouco feijão se produz nas nossas aldeias à moda antiga, e por conseguinte a sua exploração é feita de forma muito mecanizada e em grandes parcelas e mesmo assim Portugal importa aproximadamente 80% das leguminosas secas (a que pertence os feijões) que consome, apesar dos especialistas afirmarem que com as políticas certas poderíamos ser auto-suficientes. Desta percentagem de leguminosas secas, mais ou menos 75% refere-se a feijão.
Mesmo consumindo boas doses per capita, os nutricionistas consideram que os portugueses deveriam consumir mais, nomeadamente em detrimento de outras origens de proteína animal. Quem não gosta de uma boa feijoada, de branco ou vermelho, com tripas ou à transmontana, ou um grão de bico com um bacalhau com todos ou em rancho? Ou mesmo uma salada fria com feijão fradinho? Lentilhas e ervilhas secas, menos comum, mas também vão à mesa.
Em resumo, isto de feijões tem que se lhe diga mesmo que não se valorize um jogo ou uma aposta a render feijões. Fazem parte das nossas mais antigas memórias associadas aos tempos em que no campo se encontrava a nossa subsistência.
Já agora, o feijão, nomeadamente o feijão-comum (Phaseolus vulgaris), chegou até nós a partir da época dos Descobrimentos, provenientes da América Central e do Sul. As espécies mais comuns englobam o que chamaamos de feijão encarnado, o branco, o manteiga, o catarino, o canário, o amarelo, etc.. Mas há ainda variedades tradicionais portuguesas, com nomes bem engraçados, como o patareco, o vassouro, o raboto, o torino, o papo-de-rola, o crista-de-galo, o cuco, o arrebenta-panelas e o bigode-de-homem. Mas há ainda mais e perde-se a conta às variedades e espécies, seja na cor, tamanho, sabor e outras características tanto culinárias como vegetativas.
Importa, pois, valorizar os feijões, porque mesmo que disponíveis em lata, já cozidos, têm que ser semeados, regados, colhidos, debulhados, limpos e processados. Só depois é que vão à panela, á mesa e à boca. À pois é, é!