Isto de escrever para o público ler, seja ele composto de familiares e amigos, ou gente que nos tem em pouca conta, ressabiados, mesmo inimigos ou gente de toda a espécie, a farinha com que se amassa o público anónimo, tem que se lhe diga porque acarreta responsabilidades, comprometimentos e até riscos. Bem o sei e não é de agora esta conclusão, mas também pouco me incomoda porque se fosse a ter em conta apenas os inconvenientes há muito que teria deixado de escrever ou então apenas para uma espécie de querido diário de adolescentes, destes a que se coloca uma fechadura com segredo para que permaneça quanto possível como coisa escondida, íntima.
Quem passa os pensamentos e ideias próprias para o papel e os publica, seja em livro, jornal ou mesmo nesta janela aberta ao mundo da internet, redes sociais, blogues, etc, é como fazer um constante striptease expondo-se aos olhos dos observadores curiosos e afins ou, num inglesismo moderno e parolo, aos voyeurs. Há quem veja estas coisas apenas por mera curiosidade e sem lhes dar demasiado significado mas também os que com fascínio, admiração ou até excitação.
Neste palco público, mesmo que por linhas tortuosas, meias palavras, metáforas ou analogias, quem escreve acaba por pintar o seu auto-retrato e a quem observa nem é preciso formação em leitura de personalidade para perceber aquilo que é, das coisas mais triviais como o gostar de uma feijoada à transmontana até às mais intimistas como apreciar numa mulher determinadas bençãos físicas, o pensamento religioso, filosófico, passando pela simpatia clubista, partidária, ideológica, etc.
Em todo o caso, importa ter em conta que não devemos negar, esconder ou dissimular aquilo que somos e na convicção de que não devemos ter vergonha, receio ou baixa estima da nossa forma de ser, de estar e pensar. Pelo contrário, mal daquele que age apenas em função dos outros e das suas considerações, preconceitos e julgamentos. Mas há, e muita, gente dessa, incapaz de expressar publicamente uma ideia, uma opinião, um pensamento, como se constantemente castrados, condicionados, envergonhados, sempre cautelosos em cada passo dado, em cada palavra proferida. Gente que se auto açaima, com medo dos demais mas sobretudo de si próprios. Desse tipo de gente nada se espera, nenhum contributo, por mais simples e banal, para o exercício da liberdade própria e colectiva. Fôssemos todos dessa massa e não haveria na história do homem e da humanidade as grandes criações artísticas, filosóficas ou tecnológicas que no seu todo contribuiram ao longo do tempo para o progresso civilizacional. Ainda bem que gente houve e há a pensar, a contestar, a experimentar, a criar, a ser progresso.
Posto isto, entre um constante striptease com todos os prós e contras e um remetimento íntimo e castrado, creio que os prós são mais que muitos e densos o suficiente para desequilibrarem a balança que pesa e mede as decisões. Podem, pois, por enquanto, passarem por este palco onde há striptease, incluindo dança do varão, onde há lugar à opinião e pensamento próprios, mesmo que vulgares, rudimentares, goste-se, concorde-se ou não.