Na minha aldeia havia uma escola
Que se enchia de crianças
Aprendendo a escrever,
A ler, a juntar letras
Numa descoberta de saber,
A contar, a fazer contas,
A somar esperanças,
A subtrair a ignorância,
A dividir amanhãs com mais sol.
A imaginar histórias,
Contadas e pintadas.
Diziam a uma voz as tabuadas
Como na igreja a rezar avé-marias.
O recreio era todo folguedos,
Corridas, trotes e galopes,
Jogos, brincadeiras,
Um palco de heróis fingidos,
Nas aventuras duras e reais.
Eram assim os dias,
A encher as cabeças de ensinamentos
Como de água os cantis, os caminhantes
Antes de atravessar desertos.
Mas os tempos trouxeram a mudança
Como o vento de sul a anunciar chuva.
Foram saindo e crescendo,
Fazendo-se homens e mulheres,
Pedras duras do edifício da vida.
Mas num renovar minguado,
Na velha escola as algazarras
Foram perdendo fulgor e voz
E os companheiros mais solitários.
Um dia, por fim, o fim.
Alguém anunciou
Que não já não havia crianças.
A escola fechou, emudeceu.
Os ecos das leituras,
O cheiro dos lápis de cor,
Deixaram-se de se ouvir
E perderam o aroma.
Na minha aldeia
A escola já não é ela
Mas ainda lá está, triste,
Arrumada noutros ofícios,
Mas ainda a guardar memórias e ecos.
Na minha aldeia os caminhos
Já não fervilham de labuta
Pelo pão de cada dia.
Os campos já não dão pão,
E as águas são lágrimas perdidas.
Muitos partiram ou morreram,
Todos envelheceram.
É agora, a aldeia, um triste casario,
Quase sem gente dentro,
Sem vizinhos,
Bons dias ou boas noites,
Como um crepúsculo permanente
Onde a noite espera para a amortalhar
E a foice o resto ceifar
Deixando um restolho de nada,
O vazio.