3 de setembro de 2024

Sobrinca - Uma época, mil memórias

 


Terá sido fundada em 1963 por Fernando Ferreira e Américo Magalhães Ferreira, na freguesia de Caldas de S. Jorge, Santa Maria da Feira.

Implementada depressa cresceu e a Sobrinca - Brinquedos e Utilidades para Bebés, L.da, chegou a ser considerada uma das principais fábricas nacionais especializadas em artigos de puericultura e brinquedos.

Nas suas instalações industriais localizadas no lugar de Azevedo eram produzidos parques infantis, cadeiras de refeição, berços, carrinhos de bebé, andarilhos, bicicletas, triciclos e carrinhos a pedais, etc, etc.

Em 1976, os seus produtos conheceram a implementação dos plásticos nos seus diferentes artigos, autonomizando-se com a criação da IBOPAL na qual se fabircavam as peças e componentes de consumo própio.

Já na década de 1980 foi constituída IBEROBRINCA com objectivos comerciais de exportação e importação.

Na continuidade do seu crescimento, por meados da década de 1990 surgiu a SOBRINCA S.G.P.S, que passou a gerir todas as empresas criadas no âmbito da marca.

Para além do fabrico e comercialização de brinquedos e artigos para crianças, chegou a entrar no mercado de produção de mobiliário em madeira e também com participações no sector imobiliário.

Todavia, pelo início da década de 2000, com modelos de gestão duvidosos, passos maiores que as pernas e dificuldades em acompanhar as mudanças no sector e nos mercados, a empresa entrou em crise, surgindo como tábua de salvação a sua venda mas esta não resultou e pouco tempo depois deu-se a insolvência e falência da empresa e o fim de uma marca que já tinha uma história de quase meio século.

A Sobrinca foi um factor de desenvolvimento, mesmo que inicialmente com práticas deploráveis, que de resto eram comuns a outras empresas, como lançar para a rua e linhas de água os esgotos químicos das suas instalações, certo é que deu emprego a muita gente, mesmo a famílias, nomeadamente da freguesia de Guisande, que sobretudo pela década de 1970 e 1980 terão sido várias dezenas.

O certo é que passou à história e quem lá trabalhava teve que encontrar alternativas de emprego. As instalações estiveram muito tempo devolutas e de há alguns anos para cá foram requalificadas em parte e convertidas em espaços comerciais, nomeadamente de venda de material eléctrico, de pichelaria, materiais de construção civil e peças auto.

A Sobrinca, permance, todavia, como memória de um importante marco social da freguesia das Caldas de S. Jorge mas também de Guisande e outras freguesias vizinhas, pelo elevado número de empregos que facultou num tempo de transição da actividade agrícola de subsistência para o emprego industrial.

Complementando:  Nesses tempos, e sobretudo pela década de 1970, era ver os vários guisandenses a pé, ida e volta, a caminho da Sobrinca. Também era comum o pessoal da casa, esposa ou filhos, irem levar o almoço aos trabalhadores, pelo que procuravam encontrar-se a meio caminho, ali entre os lugares da Leira e Azevedo. De toda essa gente a caminho de e para a Sobrinca, talvez os mais emblemáticos tenham sido os cunhados Zé Carrêlo e Zeferino Gomes, que tantas vezes, em passo ligeiro, víamos a passar. Nesses tempos não se caminhava por desporto ou lazer mas mesmo por obrigação. Tinha que ser. E no caso da Sobrinca, a viagem até era curta, mas tantos e tantos que diariamente íam e vinham, de e para S. João da Madeira. Eu próprio, enquanto não comprei a minha própria bicicleta, durante vários anos ía e vinha a pé de junto da Capela do Viso para o fundo das Caldas de S. Jorge, por isso um pouco mais longe do que para a Sobrinca. Para almoçar subia até próximo do lugar de Azevedo ao encontro de minha mãe que diariamente nos levava o almo (a mim e a meu irmão). Resta acrescentar que tudo isso em idade de criança, sozinho, de noite, fizesse chuva ou sol. Disto não acreditarão os mais novos. Pois não!

15 de agosto de 2024

Padre José de Almeida Campos, Linhares, Almeidas e Coelhos, entre outros


Muitos de nós, sobretudo os mais velhos, já terão ouvido falar de que o Pe. José de Almeida Campos, pároco que foi da grande freguesia de Fiães, tem raízes familiares em Guisande, concretamente no lugar da Barrosa.  De facto assim é.

José de Almeida Campos é ainda vivo, tendo nascido em 8 de Junho de 1941, por isso com 83 anos de idade.

Foi ordenado sacerdote em 2 de Agosto de 1964 e foi pároco de Fiães desde 1980 até há poucos anos, tendo sido substituído pelo actual pároco, Pe. António Manuel dos Santos Martins, nascido em 13 de Junho de 1965 e com ordenação em 28 de Fevereiro de 1993 e que acumula a paroquialidade da freguesia e paróquia de S. Martinho de Argoncilhe.

Apesar da sua relação familiar com Guisande, o Pe. José de Almeida Campos, não nasceu cá nem em Fiães, como se poderia supor, mas sim em Pindelo, concelho de Oliveira de Azeméis.

Em rigor, o Pe. José de Almeida Campos, pela parte da mãe, é descendente da família Linhares. Então vejamos.

Era filho de Maria Madalena Ferreira de Almeida, que nasceu em 9 de Abril de 1915 e que casou em 14 de Setembro de 1940 com José de Oliveira Campos.

Esta Maria Madalena, entre outros, era irmã da Teresa da Conceição Ferreira de Almeida, nascida em 1 de Março de 1913, que casando com José Ferreira Cardoso foram pais de gente nossa conhecida, com a alcunha de “os Botas”, como o Sr. Mário Cardoso, o Narciso (falecido), a Margarida e a Maria Lúcia.

Era ainda irmã da Maria Madalena a Baptistina, que casou com Óscar Ferreira de Sousa e tiveram dois filhos, o José Fernando e o Domingos, este que vive na casa que era dos pais e dos avôs.

Era ainda irmão da Maria Madalena um Raimundo. Era ainda irmão da Maria Madalena, o Justino Ferreira de Almeida que casou com a Adelina “do Grilo” e tiveram vários filhos, gente nossa conhecida, como a Maria Zélia, viúva que ficou do Albero Gomes de Almeida, a Maria Eugénia, a Maria Alice, o António Albino, o José Fernando e o Raimundo Ferreira de Almeida, viúvo, serralheiro, que mora no lugar da Barrosa.

A Maria Madalena, mãe do Pe. José de Almeida Campos, e todos os seus irmãos atrás referidos, era filha de Joaquina Ferreira Linhares, nascida em 7 de Junho de 1880 e que casou em 22 de Fevereiro de 1906 com Domingos Ferreira de Almeida.

Por sua vez, a Joaquina Ferreira Linhares era filha de Margarida Ferreira Linhares, nascida em 26 de Julho de 1846 e que casou com José Gomes de Almeida, este de ascendência da família que deu origem à casa do Loureiro.

A Joaquina Ferreira Linhares teve outros irmãos, como a Ana Ferreira Linhares, a partir da qual e do seu casamento com Rufino da Silva Santos teve vários filhos como o Delfim que casando com a Dorinda Rocha, que ficou com a alcunha de “a Buraca” foram pais de vários filhos como o Albino, a Maria Eugénia, o António, o Delfim, a Silvina, o Domingos, o Fernando, o Rufino, pai do Carlos Almeida e o Marindo, pai do Johnny Almeida.

- Dos irmãos de Joaquina Ferreira Linhares, ainda a Teresa Ferreira de Almeida que casou com Joaquim Ferreira Coelho, tendo estes sido os pais do Joaquim Ferreira Coelho que casou com a Cristina Amélia dos Santos, ainda o José Coelho Gomes de Almeida (Zé do Coelho) e o Abel Lafaiete.

Por sua vez a Margarida Ferreira Linhares, mãe da Joaquina Ferreira Linhares, era filha de José Custódio Linhares que casou com Maria Joaquina da Costa. Esta Margarida Ferreira Linhares teve vários irmãos, entre os quais o Joaquim Custódio Linhares, nascido em 27 de Setembro de 1834, que casou com Margarida Gomes e que entre outros filhos foram pais de Manuel Ferreira Linhares, falecido em 26 de Julho de 1956 e que casou com Olívia Margarida dos Santos, falecida em 4 de Junho de 1958 e que tiveram filhos entre os quais o António Ferreira Linhares que casou com Rosa Ferreira de Castro e que tiveram vários filhos, alguns ainda vivos, como a Sr. Rosa do Linhares que vive em Casaldaça, esposa do Fernando de Oliveira Pinho e mãe do Fernando e do Valdemar. Ainda o Manuel, conhecido como “o Capitão”, que era casado com a Angelina do “Neto”, da Barrosa, ainda a Margarida Maria, a Maria Margarida, a Maria Adelaide, esta que casou com o Manuel de Almeida Azevedo e que tiveram filhos como o Manuel (do Talho Frescar, na Pereirada), o António e o José Carlos. Ainda a Maria Laura, ainda viva e moradora no lugar da Pereirada, mãe do Nuno, da Cecília e da Susete.

Como se vê, o Pe. José de Almeida Campos tem raízes familiares em Guisande e cujos ramos são vários e numerosos e produziram muita gente, muitos, mesmos dos mais velhos, ainda vivos e moradores em Guisande.

Como atrás referi, toda esta família ascende à origem da família Linhares na nossa freguesia que até onde consegui pesquisar, foi até ao atrás referido José Custódio Linhares, do lugar de Casaldaça, que casou com a Maria Joaquina da Costa. Por sua vez, subindo na árvore genealógica, este José Custódio era filho de José Custódio, do lugar da Lama, e de Maria Joana de Jesus. Por sua vez este José Custódio (pai), era filho de Joaquim Pinto Ferreira e de Maria Pinta. Por sua vez este Joaquim Pinto Ferreira era filho de Pedro Ferreira e Maria Pinta.

Pesquisar mais nomes, andar para trás no tempo, é missão quase impossível pois como se percebe os próprios apelidos não têm continuidade e perdem-se. Mesmo o apelido Linhares só aparece com o José Custódio (filho) e mesmo assim apenas num documento, já que nos demais apenas aparece escrito como José Custódio.

Claro está que toda esta família dos Linhares é mais vasta e com vários ramos já que o referido José Custódio (filho) teve vários irmãos e vários filhos para além dos aqui mencionados.

Fica, pois, este resumo que já diz muito do passado e presente das respectivas famílias que se entroncam ou entrecruzam.

2 de agosto de 2024

A vida do Chico deu uma volta

O Chico do Vieira enviuvou cedo. Tão medonho mal apanhou a Alzira que em pouco se apagou. Depois de desanuviada a negra nuvem da dor e do luto, ainda o rondaram com oferecidos galanteios, daqueles que só não vê quem é cego, algumas jeitosas pretendentes, solteironas, divorciadas e até mal casadas, sabedoras da sua gentileza, da boa estampa apesar de maduro, com casa montada, bom carro e emprego estável numa repartição pública, mas a todas esvaziou com a subtileza dos comportamentos de lobo solitário. Considerou que o que precisava depois da partida da sua alma gémea, era cumprir na solidão uma caminhada de serenidade, física e espiritual, quase como uma travessia de deserto daquelas que buscam os santos eremitas.

Logo depois, chegada a hora, nem mais um segundo, reformou-se e desde esse primeiro dia que se impôs a uma rotina disciplinadora para que não se perdesse numa modorra que conduz ao limiar da loucura. Assim, levantava-se sempre às sete e meia da manhã, espreitasse o sol pela janela do quarto ou nos vidros da janela batessem as gordas bátegas de chuva. A seguir, na casa de banho, eram sempre quinze minutos para o essencial, o escanhoar da barba e do ordenamento da basta cabeleira, já grisalha. Banhos gostava de os tomar antes de deitar. De seguida o pequeno almoço na pastelaria da esquina, a leitura das gordas nos jornais, e minutos depois caminhava já em passo acelerado pelos caminhos da redondezas, tanto quanto possível por onde não andasse alguém. Ao meio dia-e-meio era cliente diário no restaurante do Quintela. E era assim o resto do dia com coisas certas, a horas marcadas, como que comandado por um treinador de apito na boca e cronómetro na mão. Conversas poucas e só com amigos raros e mesmo assim apenas para não dar ares de bicho de buraco. Mas, não fora essa obrigação social e consideração de outros tempos, dispensaria de bom grado as conversas de lana caprina sobre o estado do país, da política e dos políticos, do futebol, etc..

Deitava-se sempre às onze, depois de ler algumas páginas de um dos muitos livros e em regra dormia bem até que o ciclo recomeçava no dia seguinte. Corriam os dias, as semanas e os meses e com eles os anos pareciam cavalgar num trote certinho, sem sobressaltos.

Um dia, porém o Francisco, não se sabe por que carga de razões, quebrou a rotina e foi tomar o pequeno almoço na freguesia vizinha e servido por tão graciosa rapariga, de olhos negros profundos, num corpo esbelto de viço, e tão simpática e afável no trato como se o conhecesse desde sempre. Não consegue justificar-se sobre que aranha lhe mordeu quando percebeu que começou a ir ali, não apenas uma, mas duas ou três vezes por semana e não somente pelos pastéis de nata ou torradas. Pouco mais à frente, já era presença diária e fazia por prolongar aqueles momentos que ali passava simulando que se entretinha a ler o jornal de fio a pavio e a terminar com uma bagaceira, mas na verdade sempre com os olhos a fugirem para os da empregada que, mais doces que os pastéis que servia, os encontrava e retribuía. Começou a baralhar as tarefas que tinha na rotina inabalável dos seus dias, saltando umas e adiando outras. Começou a dormir mal e aquela rapariga, tenra e deslumbrante, era presença nos seus sonhos à noite e pensamentos à luz do dia.

Certo é que passados alguns meses toda a freguesia ficou pasmada quando se espalhou a novidade de que o Francisco se juntara à Teresinha da pastelaria Estrela da Manhã, e de malas aviadas mudara lá para os lados de Castro Daire, de onde era natural a moça.

Há assim nas nossas vidas um não sei quê de que destino, fatalidade ou apenas acaso, que quando damos por ela, dá cabo das mais fundamentadas rotinas, descompondo ideias, desorganizando sonhos, distorcendo as linhas rectas e paralelas que nos guiam, fazendo descarrilar o comboio com as dezenas de carruagens onde arrumamos as nossas coisas certinhas.

Feitas as contas, terá sido melhor assim. Seria demasiado penoso que o Francisco não fosse capaz de se desamarrar daquela disciplina monocórdica que lhe fazia os dias todos tão iguais, tão minuciosamente agendados e preenchidos em todos os minutos e horas dos dia e noites, que às tantas aquilo já não era vida, mas somente um existir, um relógio dominador, uma engrenagem de movimento perpétuo.

Já passaram uns largos meses e a freguesia não voltou a ter notícia do Chico. A filha, a quem entregou as chaves da casa sem grandes justificações, também abalada com a decisão assim de supetão, mal se vê pela aldeia, evita os contactos e se interpelada nem chus nem mus.

Não sabemos, por isso, como corre a vida do Francisco com a fresca Teresinha, lá pelas bandas de Castro Daire, mas por mais revolta e imprevista que seja, será certamente vivida, em que cada dia é diferente do anterior como inesperado será o seguinte. Sem regras, apenas de improviso. Porventura, descascada a sumarenta da companheira, já a achará chocha, desenxabida, ou ela, de tanto o já ter espremido, seguiu para outro pomar, mais fresco. Talvez, uma ou outra coisa ou nenhuma delas, mas na certeza de que a vida do Chico deu uma volta de pernas-para-o-ar. Se caiu de patas como os gatos, se de cu-catrapuz, por ora ainda não se sabe.

Talvez regresse um dia destes, cabisbaixo, rendido, a retomar a antiga rotina, a voltar a almoçar no Quintela, feijoada às sextas, rojões ao Sábado, cabrito ao Domingo.... Talvez!

1 de agosto de 2024

Viagem Medieval? Não, obrigado!

 Há 20 anos que não ponho os meus pés na Viagem Medieval.

Apenas por umas poucas razões: 

1 - A primeira desde que, enquanto membro da Comissão de Festas cá da terra, solicitei um apoio da Câmara Municipal de Santa Maria da Feira à componente cultural,  pela participação de duas bandas filarmónicas, e nem sequer merecemos resposta nem a atribuição de 1 euro que fosse.

2 - Não concordo que enquanto cidadão livre, defendido pela Constituição, que me permite a livre circulação no espaço público não o possa fazer durante quase duas semanas, numa zona nobre e ampla de uma cidade, convertida por esses dias num parque temático.

3 - Se gostei da genuinidade das primeiras edições, e ainda no castelo, depressa percebi que a coisa se massificou. Não sou adepto de entretenimento massificado. Defeito meu, admito! 

Mesmo assim, da duração, creio que 4 dias seriam suficientes. 12 é um exagero e todo o constrangimento que daí decorre. Quem por ali vive ou trabalha, melhor é meter férias e dar de frosques.

Reconheço obviamente a importância económica para o concelho, seja quem disso beneficie, e serão muitos, mesmo que digam que quase sempre os mesmos, mas como dela não colho 1 euro, é daquelas coisas relativas, a desconsiderar porque de que vale sermos ricos por ter o ovo no cu da galinha do vizinho? Além do mais, nem tudo pode ser justificado pelo dinheiro e receitas.

Apesar de tudo, é engraçado ver tanta gente feliz a fazer de conta que é cavaleiro, a comer e a beber sem olhar a preços, sempre exorbitantes . Assim fossem tão empenhados estes nobres e valentes cavaleiros de fingimento a apanhar batatas. Não são, mas que se divirtam!

Passarei pelo burgo logo que que o espaço público atravancado seja devolvido aos cidadãos, assente a poeira das batalhas fingidas e dissipado o cheiro a porco no espeto.

26 de julho de 2024

Postal do dia - Obrigado ao Johnny Almeida e à Comissão Fabriqueira


Tenho escrito e falado sobre o assunto, o da necessidade de obras de conservação na nossa capela dedicada a Nossa Senhora da Boa Fortuna e a Santo António, popularizada como Capela do Viso. Em Maio de 2023 escrevi sobre isso e de que então já havia o propósito de realizar obras.

Mas não se realizaram e em Agosto desse ano, decorreu a nossa maior festa comunitária, a Festa do Viso, com a capela, sobretudo o interior, em mau estado do reboco das paredes, como uma nódoa ali a envergonhar-nos, perante nós próprios e sobretudo para quem nos visitava.

No arraial gastava-se dinheiro em artistas e em foguetes e na capela, em que reside o motivo maior, via-se aquela situação. As imagens que ilustram este apontamento são elucidativas.

Pensei eu que, entretanto, seriam feitas as obras para que a situação não se repetisse na festa deste no de 2024. Todavia, porque entretanto foi dada prioridade às obras do Salão Paroquial, felizmente já feitas e bem feitas, parece-me, o tempo ficou apertado e de novo a capela a correr o risco de se apresentar vergonhosamente à comunidade local e forasteira, tanto mais quando vamos ter o privilégio de cá ter o bispo auxiliar do Porto, D. Roberto Mariz, a presidir à celebração da Missa Solene.

Pessoalmente é uma situação que me envergonha e desde logo porque acho paradoxal que se faça uma festa com qualidade no arraial e na capela se veja esta pobreza de estado de conservação. Quem não se envergonha ou incomoda com isto?

Neste contexto, mesmo que a título pessoal e informal, questionei sobre o assunto alguém do Conselho Económico – Comissão Fabriqueira, no caso o Johnny Almeida, o qual reconhecendo a situação, se prontificou a analisar a mesma no sentido de ver se ainda a tempo, mesmo que de forma provisória, fosse possível retocar os pontos mais deteriorados.

Contactou-me entretanto a confessar que a situação era mesmo grave e que a coisa já não se resolveria apenas com uma intervenção ligeira. Assim, num compromisso de esforço e dedicação, e deslocando pessoal da sua empresa de outros trabalhos, comprometeu-se a que nestes dias e até à festa, irá fazer uma intervenção que seja já de forma definitiva, mesmo que apenas parcialmente, porque de facto não haverá tempo para mais.

Assim, começará a revestir as paredes interiores desde a parte do coro até onde for possível até aos altares laterais. A solução é a mais adequada, com aplicação de revestimento em placas de gesso cartonado, já que a solução de reconstrução do reboco pelo método tradicional, para além de mais demorado não resolveria o problema de humidades e salitre e dentro de poucos anos o problema voltaria.

Neste contexto, comprometeu-se pessoalmente e pela Comissão Fabriqueira a fazer os possíveis para nestes próximos dias revestir a maior área de paredes possível. O tempo é curto mas com competência será possível atalhar.

Pessoalmente não tenho quaisquer responsabilidades nem peso decisório na matéria e a minha interpelação foi apenas a título pessoal, mas não posso deixar de agradecer aqui publicamente a sensibilização do Johnny Almeida, e estou certo que de acordo e conhecimento com os demais elementos, incluindo o pároco Pe. António, bem como à sua dedicação e empenho, mesmo que com inconvenientes para a organização dos trabalhos da sua própria empresa.

É de facto meritória a sua acção e mesmo sem ver o resultado do trabalho, e se não surgirem obstáculos, acredito que pela sua competência será capaz de, mesmo que de forma incompleta, dar a dignidade adequada à capela e à altura da festa que recebe em honra de Nossa Senhora da Boa Fortuna.

Há alturas em que é preciso pôr mesmo o carro à frente dos bois, pois parece-me que nestas coisas de atalhar problemas, tantas vezes é pior nada fazer do que fazer menos bem ou de forma mais apressada.

Pela parte que me toca, obrigado ao Johnny Almeida e à Comissão Fabriqueira pelo interesse que acolheu a minha interpelação e se prontificou a mitigar essa nódoa na nossa capela no dia da sua festa maior.

Sem fazer julgamentos antecipados, até porque a equipa é nova, parece-me que é neste caminho que se tem que trabalhar, de forma decidida, sem as crónicas hesitações que só adiam e agravam os problemas e as necessidades.

Conservar com dignidade o nosso património comum é respeitar o legado de quem ao longo dos tempos o edificaram e transmitiram.

Bem hajam pela vontade, dedicação e acção!



22 de julho de 2024

A importância do Centro Cívico

Vamos ter na nossa Festa do Viso, neste ano de 2024, serviço de refeições que funcionará no Centro Cívico. Foi anunciado pela Comissão de Festas e confirmado pelo presidente da Comissão Administrativa do Centro Social S. Mamede de Guisande, Joaquim Santos. O serviço ficará ao encargo do Armando Ferreira e da esposa Isabel Paiva, do Café Fornos, pelo que aguarda-se boa qualidade e diversidade.

Confesso que fico satisfeito, desde logo porque sabe sempre bem almoçar, jantar ou petiscar na nossa festa. Pode ser tudo muito simples mas ali, naquele local e momento, as coisas sabem melhor.

Sem ter a certeza, presumo que tal como no ano anterior, teremos também a tasca do Guisande F.C., também a servir algo para comer. Seria interessante para além de que será bom para todos.

Fico satisfeito por outro lado pois percebe-se que a instalação do Centro Cívico, mesmo que ainda sem cumprir com o motivo principal da sua edificação, o de ser um Centro de Dia, e que ainda só não acontece por questões políticas e de poupanças e retenções em diferentes governos, tem sido de uma enorme utilidade no apoio das actividades da nossa comunidade, como é o caso da organização da Festa do Viso.

Todavia, e como nem tudo é perfeito, em contraposição a esta concensual utilidade da instalação, fica o desconsolo de constatar que para além disso, ninguém se chega à frente para assumir responsabilidades directivas no Centro Social. Ora como não apareceram listas candidatas nas duas anteriores assembleias gerais, o Centro Social está a ser gerido com serviços mínimos por uma Comissão Administrativa e que entretanto também terminará o seu mandato.

Temos assim esta duplicidade, com realidades diferentes: Por um lado o inegável interesse do Centro de Dia, e por outro lado o desinteresse e desvio às responsabilidades, levando a que ninguém apareça para assumir e dinamizar a Associação do Centro Social.

Onde é que isto vai levar? Não sei responder. Preocupa-me? Claro que sim, mas como já dei para esse peditório, fazendo parte dos corpos gerentes em vários mandatos, é responsabilidade que por agora não quero repetir. De resto, há muitos  e bons, e bem mais novos, na possível lista de espera. Assim tenham essa vontade como nós, quando éramos bem mais novos, tínhamos! É o que se espera da renovação de uma comunidade.

16 de julho de 2024

Memórias - As artes e ofícios em Guisande


Na nossa freguesia de Guisande, até meados da década de 1970, se quisermos até à revolução do 25 de Abril de 1974, o grosso da população dedicava-se à agricultura, mesmo que, pela natureza dos prédios e sua topografia, no geral de reduzidas dimensões, num regime de minifúndio, isto é, para rendimento e auto-sustento ou subsistência familiar.

Complementarmente ao que as terras produziam, essencialmente milho, centeio, feijão e mais tarde as batatas, para além dos habituais produtos da horta e pomar , eram comuns os animais, como gado bovino, quer como força motriz nos diversos trabalhos, quer como produção de leite e de carne sendo que esta essencialmente resumida à criação de porcos, animais de capoeira e a algumas ovelhas.

A partir desse período, as actividades industriais começaram a generalizar-se e com isso o aumento de fábricas na nossa zona, nomeadamente por S. João da Madeira e Arrifana, com predominância do sector do calçado, mas também e ainda mais próximo, na freguesia de Caldas de S. Jorge, com o aparecimento de fábricas como a Sóbrinca e Bébécar, e outras mais, como a Brinquel e a Fabruíma, dedicadas a produtos de puericultura e utilidades domésticas.

Ora algumas destas fábricas vieram a absorver muita dessa mão-de-obra até então dispensada ao sector agrícola, sobretudo de homens e rapazes, mas ainda algumas raparigas, garantindo às famílias um rendimento certo ao final do mês.

Com esta generalização do sector industrial, bem como do desenvolvimento da maquinaria e processos de produção electro-mecanizados, ainda a extensão da escolaridade obrigatória até altas idades e terminado o trabalho infantil, aos poucos foram-se perdendo as actividades até aí artesanais que comportavam saberes ancestrais.

Tomando como referências as profissões descritas em muitos dos assentos paroquias de Guisande, para além das mais comuns ligadas aos campos, matos e pinhais, como agricultores, lavradores, jornaleiros, carreteiros, ou serradores, existiam alfaiates, sapateiros, carpinteiros, ferreiros, cesteiros, tamanqueiros, pedreiros, costureiras, tecedeiras, rendeiras, etc.

Como já não sou rapaz novo, ainda me lembro de vários destes artesãos e de alguns até de os ver a trabalhar, como alfaiates, o Ti Delfim em Casaldaça e o Ti Joaquim Pisco na Igreja, costureiras como as Fonsecas, primas da minha mãe, a tecedeira Isabel do Moleiro, na Barrosa, o cesteiro Ti Manuel do Caseiro, em Cimo de Vila, o ferreiro Ti Raimundo do Reimão em Casaldaça, ainda carpinteiros, sapateiros, etc.

Hoje em dia, e já de há muito tempo, porque deixaram de compensar tais artes nem foram passados os ofícios, já nada existe para além das memórias. E mesmo algumas coisas materiais que pudessem servir de testemunho, como um tear e bancas de carpinteiro ou sapateiro ou forja de ferreiro, há muito que foram desmanteladas e o que fosse de arder queimado foi, e o resto lançado para a sucata e calabouços do tempo.

Pode-se ter pena e uma saudade bucólica dessas artes e ofícios, mas o tempo e as mudanças inerentes não se compadecem com lirismos e por isso tudo subjuga à produção mecanizada, em série mesmo que impessoal. 

Face a esta fatalidade, imparável, pelo menos que se guardem as memórias de quem ainda as tiver, e se perpetuem, incluindo os nomes de quem, nos diferentes tempos, soube fazer com arte e mestria o dia-a-dia d euma terra, de uma comunidade.